quarta-feira, fevereiro 21, 2018

Diferentes

Digamos que um sujeito chamado André conheceu uma garota chamada Elaine.

Ele convida-a para ir ao cinema; ela aceita; eles vão e se divertem.
Alguns dias depois, ele a convida para jantar, e também se divertem.

Eles continuam a se ver regularmente e, depois de um tempo, nenhum deles consegue sair com outra pessoa. Então, numa noite quando estão voltando para casa, um pensamento vem à cabeça de Elaine, que, sem muito pensar, diz:
- Você se deu conta de que esta noite faz seis meses que estamos saindo juntos?

De repente, um silêncio instaura-se no carro.
Para Elaine, é um silêncio longo e profundo. Ela pensa: “Xiii, espero que ele não se chateie com isso. Talvez ele esteja se sentido sufocado pelo nosso relacionamento. Talvez esteja pensando que eu estou tentando forçá-lo a um compromisso que ele não esta querendo no momento, ou não tem muita certeza”.
E André está pensando: “Nooooooooooossa! Seis meses!”.

E Elaine pensa: “É, mas eu não sei se ele está querendo este tipo de relacionamento. Às vezes eu penso que seria bom eu ter um pouco mais de espaço, para ter um tempo para pensar no que eu quero deste relacionamento, para onde estamos indo… Isto é, se é ele mesmo que eu quero, se queremos continuar nos vendo deste jeito ou queremos mais intimidade… Será que vamos adiante? Namorar? Compartilhar nossas vidas? Será que eu estou pronta para este compromisso? Será que eu o conheço tanto assim?”.
E André pensa: “Seis meses… Quer dizer que foi em abril, logo depois que eu comprei o carro… Isso quer dizer que… deixe-me ver o odômetro… Xiii… Passei a troca de óleo!”.

Elaine está pensando: “Ele está chateado. Posso ver isso no rosto dele. Talvez eu esteja redondamente enganada. Talvez ele esteja querendo mais do nosso relacionamento, mais intimidade, mais compromisso; talvez ele tenha percebido, ate mesmo antes de mim, que eu estou com algumas reservas. Sim, aposto que é isso. É por isso que ele está tão relutante em falar de seus sentimentos. Ele tem medo de ser rejeitado”.
E André pensa: “Eu preciso ver essa caixa de câmbio. Não interessa o que essa besta de mecânico diz, não tá engatando direito. E não venha ele me dizer que é por causa do frio. Já estamos quase no verão e esse câmbio ainda está duro. E olhe que eu paguei 600 paus pra ele consertar”.

E Elaine pensa: “Ele esta zangado. E não posso culpá-lo. Eu estaria zangada também. Meu Deus! Sinto-me tão culpada, deixando-o deste jeito. Mas não posso impedir de me sentir insegura…”.
E André pensa: “Com certeza ele vai me dizer que a garantia de três meses já terminou. Desgraçado, eu sei que e isso que ele vai dizer!”.

E Elaine continua pensando: “Talvez eu seja muito idealista, esperando por um cavaleiro no seu cavalo branco, enquanto estou sentada ao lado de um sujeito legal, um cara com quem gosto de estar, um sujeito que se preocupa comigo e com quem eu me preocupo. Um cara que está magoado pelo meu egoísmo, pela minha fantasia de colegial”.
E André continua pensando: “Garantia? Foda-se a garantia. Eu quero e meu câmbio funcionando. Eu quero meus direitos!”.

- André - diz Elaine em voz alta.
- O quê? - responde André, assustado.
- Por favor, não se torture deste jeito - ela continua, os olhos enchendo-se de lágrimas - Talvez eu não devesse… Oh, meu Deus, estou me sentindo tão… - Ela para, soluçando.
- O quê? - pergunta André.
- Eu sou uma tonta - diz Elaine - Quero dizer, sei que não existe cavaleiro. Eu sei disso de verdade. É besteira. Não há cavaleiro, e não há cavalo.
- Não há cavalo?- pergunta André.
- Você está pensando que eu sou boba, não é? - pergunta Elaine.
- Não - diz André, aliviado por ter encontrado finalmente a resposta correta.
- É só que eu preciso… - continua Elaine - preciso de um tempo.

Passam-se quinze segundos, durante os quais André, pensando o mais rápido que pode, tenta encontrar uma resposta conveniente. Finalmente ele acha uma que deve servir:
- Está certo.

Elaine, profundamente magoada, toca na mão dele.
- Oh, André, você realmente se sente desse jeito?   
- Que jeito? - pergunta André.          
- Desse jeito sobre o tempo - diz Elaine.      
- Oh - diz André - Sim.

Elaine vira-se para ele olhando-o no fundo dos olhos, assustando-o com o que ela vai dizer, principalmente se estiver envolvendo um cavalo!
- Obrigada, André - ela diz.
- Obrigado - diz André.

Ele leva-a para casa. Ela deita na cama, em conflito, com a alma torturada e desaba a chorar.
Enquanto isso, André vai para a casa dele, põe um pacote de pipoca no microondas, liga a televisão e se liga profundamente num jogo de futebol do campeonato italiano entre dois times que não importa quais sejam: importa tão somente a arte do jogar futebol.. Uma voz lá do fundo avisa que alguma coisa séria foi discutida no carro, mas ele tem certeza de que ele não iria entender mesmo, portanto é melhor nem pensar nisso. O que, aliás, é o que ele também pensa a respeito de muitas coisas...

No dia seguinte, Elaine vai ligar para sua melhor amiga, ou talvez duas, e elas ficarão conversando a respeito da situação por seis longas horas. Elas analisarão tudo o que foi dito, até os detalhes mais doloridos, voltando no tempo e fazendo projeções, explorando cada palavra, cada expressão, cada gesto para entender as nuanças de significado, considerando qualquer ramificação plausível. Elas continuarão a discutir este assunto por semanas, talvez meses, sem nunca chegar a uma conclusão, mas sem, nunca, se cansar.

E o André, ao jogar tênis com um amigo comum, irá dar uma parada antes de sacar e perguntará ao amigo:
- Hei, você sabe se a Elaine já teve um cavalo?

A volta

Voltar a ler
Voltar a escrever

tão distraidamente voltar a ser

quarta-feira, março 08, 2017

Hoje é dia coletividade
SORORIDADE
palavra da vez

Hoje é dia de estender a mão
Esquecer de julgamentos
-sempre errados, saiba-
Ignorar as amarras mentais que
Quando em quando
Vêm

Hoje é dia de pedir perdão
À PUTA, À VACA, À FRÍGIDA, À LOIRA
Entenda, não é demagogia... teus xingamentos são teus e vieram da tua bagagem - machista- de sobrevida

Hoje é dia de pensar com teu EU e se questionar sobre o que está enterrado em teu discurso e que escuto de longe

Hoje é dia de zelar pelo teu sono, mas sobre tudo pela tua VIGÍLIA pois foi enquanto tantas de nós dormíamos que a mordaça foi feita

Hoje é dia de ler ELAS que transformam o mundo com suas palavras, mas costumam - nada ao acaso - ser apagadas dos livros didáticos de literatura

Hoje é dia de assistir ELAS que impactam com suas atuações, mas seguem sendo reduzidas a salários inferiores, e ao processo perverso de CARNIFICAÇÃO

Hoje é dia de pensar a arte DELAS que pintam, modelam, refletem a sociedade, mas enfrentam a marginalização e são, com frequência,  expurgadas das galerias

Hoje é dia de ouvir ELAS que cantam, tocam e encantam doces ou não com suas notas, mas que escapam dos grandes halls da fama

Hoje é dia de estudar ELAS que pensam, criam, pesquisam e geram conhecimentos através dos quais SIM o mundo teria ficado para trás

Hoje é dia de agradecer a ELAS que organizam casas, colocam comida na mesa e passam, muitas vezes, a vida inteira pensando nos outros antes de nelas mesmas

Hoje é dia de olhar com carinho para ELAS que a noite vestidas inapropriadamente correm atrás de caminhões e de lixos para removê-los da tua rua

Hoje é dia de pensar além da caixa ao se deparar com ELAS que são maioria nas escolas na arte que se espera ser incansável de fazer um pouco mais ganhando tão menos

Hoje é  dia de saber que ELAS TODAS ainda ganham até 67% menos do que ELES simplesmente por serem assim: tão ELAS... tão impreterivelmente mulheres

Hoje é  dia de se dar conta que enquanto escrevo este texto (em torno de 11min)  ao menos UMA MULHER FOI VIOLENTADA NO BRASIL, porque este é um dado e contra fatos não há argumentos

Hoje é dia de saber que da hora que escrevi este texto até a hora em que estas lendo exatamente essa frase pode ja ter passado 2h, ou 4h ou 6h ou 8h ou 10h ou muitas outras 2h... e A CADA DUAS HORAS UMA MULHER É MORTA AQUI NA NOSSA PÁTRIA AMADA


Tinha que ser mulher, vir escrever isso
Bem teu tipinho
 SIM

terça-feira, março 07, 2017

Pode ser que a solidão bata a sua porta...

Shhhhhhh

Ouço seus passos... pé ante pé
É a madrugada

E doída
E doida
E toda
Inteira

Arrastando suas correntes me traz Lygia, Clarice, Virgínia... me traz um vulto apagado e sem contorno de mim

Eu
Tão eu
Tão outra

Ouça!!! Batidas estrondosas no corredor
Chegou na vizinha
Será que desiste?

Shhhhhhhhhh

Vou calar na alma
Mais uma vez na vida
E

segunda-feira, novembro 14, 2016

Um dia seu melhor momento passa, seu grande ato acaba... um dia seu brilho se apaga, sua vida se transforma... um dia o cabelo se encurta, as saias de alongam... um dia os saltos se abaixam, as certezas se acabam... um dia sua pele lisinha se marca (braille da vida) e seu corpo se muda inteiro... um dia sua voz engrossa um tanto e seu tempo passa a valer muito mais... um dia seu nariz e orelha crescem e nada mais não na mesma intensidade... um dia seus olhos trocam o fogo da nova experiência pelo mistério do que já se viveu... um dia o jogo de cabelo e sorrisos maliciosos não significam mais nada diante de uma postura impetuosa e aura indecifravelmente sedutora... um dia o sentimento de insegurança diante do novo acaba e você passa a ser -paradoxalmente- o novo... um dia o desejo de chamar a atenção do outro passa e fica um apreço pela sua própria companhia... um dia as fotos não serão tudo, tão pouco serão nada, mas serão assim fotos como devem e lhes cabe ser... um dia nada mais vai importar tanto porque o que mais importa já terás: uma história, uma identidade tão flexível e flutuante e ao mesmo tempo tão sua, tão confortável... um dia... ah, um dia...

quarta-feira, julho 17, 2013

Compartilhando

Da uma saudade... nem sei bem do que... talvez de amigos... talvez de algum lugar... talvez de um tempo... talvez de mim mesma... saudade íntima... extraño!

http://www.youtube.com/watch?v=ul9PDed9gCY

segunda-feira, junho 10, 2013

Revés



Hoje vai ser um dia difícil, por que sempre é difícil rever?
Rever trabalhos inacabados
Rever relacionamentos acabados
Hoje vai ser difícil porque preciso rever
Rever, não revisitar
Revisitar normalmente é tão fácil

quinta-feira, dezembro 13, 2012

Sumi

Porque não é saudável esperar príncipe encantado
Porque não é saudável recorrer, sempre, ao passado
Porque não é saudável revisitar velhas fotos
Porque não é saudável contar quantas horas haverá de sono
Porque não é saudável voltar aos mesmos temas
Porque não é saudável viver sem coerência
Porque não é saudável... parei de escrever

Sem escritura, sumi
Sem príncipe, sem passado, sem álbuns, sem dormir, sem assuntos e coerente: sumi
Volto? Será possível?